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Importância da caracterização genética do coelho bravo (Oryctolagus cuniculus) para a gestão e conservação das suas populações

Paula Cristina Fernandes Campos

O coelho bravo (Oryctolagus cuniculus) é uma espécie originária da Península Ibérica. A investigação da sua diversidade genética, levou ao reconhecimento de dois grupos evolutivos, um no Sudoeste (SO) e outro no Nordeste (NE), que deram origem às duas subespécies actualmente reconhecidas, Oryctolagus cuniculus algirus e Oryctolagus cuniculus cuniculus, respectivamente, e que formam uma zona de contacto secundário na região central da Península Ibérica ao longo de um eixo Noroeste-Sudeste (Branco, 2000; Branco et al., 2002).

Nos últimos anos as populações desta espécie têm sofrido uma acentuada diminuição do seu efectivo. As crescentes pressões a que o coelho bravo está sujeito, alterações ambientais, aparecimento de novas patologias, mas principalmente o acentuado aumento da pressão de caça, reforçam cada vez mais a importância de uma adequada gestão das suas populações naturais.

Com este trabalho pretendeu-se contribuir para a optimização da gestão das populações naturais desta espécie através do desenvolvimento e aplicação de técnicas moleculares. Assim, definimos três objectivos principais para este trabalho: i) Definir os padrões de introgressão natural e artificial no território nacional, assim como definir padrões de diferenciação regional, por PCR-RFLP do gene mitocondrial citocromo b, ii) Estudar a história demográfica das populações portuguesas de coelho, através da sequenciação da região de controlo do mtDNA, iii) Caracterizar a variabilidade do intrão 5 da CAII e comparar estes resultados com os obtidos com o mtDNA.

Apesar de grande parte do território nacional ser caracterizado pela presença quase exclusiva da linhagem mitocondrial A, os resultados da caracterização genética do DNA mitocondrial de coelho bravo em Portugal continental revelam padrões contrastantes de introgressão, essencialmente localizados a norte do rio Douro. A Noroeste foi detectada introgressão artificial que confirma a prática corrente e nociva de repovoamentos com animais de origem doméstica. Já a Nordeste, foi detectada introgressão natural, dado que nesta região se encontra o limite noroeste da zona de contacto secundário entre as duas subespécies. A presença da linhagem mitocondrial B define ainda outra região a Sul do Tejo que vai desde o interior até ao litoral alentejano. Apesar deste facto poder ter diversas interpretações, podendo ser o resultado quer de uma introdução recente, tendo por isso uma origem antropogénica, quer da expansão recente do núcleo populacional do Nordeste/Leste da Penísula Ibérica, a segunda hipótese parece ser a mais provável. Para além disto, a região sul da Península Ibérica confirma-se como o centro da expansão geográfica do grupo algirus, tanto para Norte em direcção a Viso del Marques, Ciudad Real e Toledo, como para Noroeste em direcção a Mourão e Vila Viçosa, tendo a expansão geográfica das populações do Sul de Portugal originado posteriormente as populações do Norte. Esta direcção de colonização é comprovada pelo declínio dos índices de diversidade genética de Sul para Norte. No entanto, e ao contrário do que acontece na região Sudoeste, na região Nordeste da Península Ibérica não se observa um padrão evidente de expansão geográfica.

O estudo da variabilidade do intrão 5 da anidrase carbónica II na Península Ibérica não confirmou o cenário inferido através do estudo do polimorfismo proteico desta proteína. Não foi encontrado nenhum padrão de estruturação geográfico muito provavelmente devido ao elevado fluxo génico entre as regiões Sudoeste e Nordeste da Península Ibérica. Assim, não será muito útil usar a informação da variabilidade deste fragmento para a definição de padrões de diferenciação regional dentro da Península Ibérica e consequentemente na gestão das populações naturais de coelho.