Ferreira da Silva | Química para a vida, uma vida de química.
7 A minha memória mais remota do Professor António Joaquim Ferreira da Silva prende-se com a do laboratório de química analítica com o seu nome, no primitivo edifício da Faculdade de Ciências. Enquanto aluna da única cadeira de Química do bacharelato em Física no final da década de 1970, tinha de entrar nele e percorrê-lo até à escada no canto para aceder ao andar de cima, onde existiam alguns gabinetes de professores. Já neste século, e recentemente chegada ao Museu de Ciência, voltei a franquear este emblemático espaço, agora despido da sua função original. Assisti (e tomei parte) na sua transformação numa improvisada sala de reservas do Museu, nele se amontoando mobiliário de diferentes épocas, material expositivo, livros e instrumentos científicos históricos dos antigos Laboratórios de Física e Química, num pot-pourri indescritível. Fui gradual e apaixonadamente mergulhando em documentos manuscritos, fotografias, literatura técnica e biografias de professores e cientistas, enquanto ia crescendo como curadora destas coleções. Vi-me, assim, numa posição privilegiada para documentar as diferentes fases arquitetónicas do Laboratório Ferreira da Silva ao longo das quase nove décadas em que funcionou como laboratório de ensino. Tal acompanhamento viria a apoiar a concretização do projeto de requalificação executado entre 2017 e 2018. A investigação conduzida na documentação em arquivo para dar a conhecer o contexto em que instrumentos científicos foram usados, aproxima inevitavelmente o investigador de quem produziu esses registos no decurso das suas atividades rotineiras. Em contínuo, tornam-se tão próximos como membros da própria família… existindo o risco de o investigador incorrer no culto da personalidade, se acontecimentos e agentes não forem colocados em perspetiva. Porém, mesmo procurando distanciar-me, deixei-me envolver e fascinar pela atualidade das lições de vida do Professor Ferreira da Silva. Ferreira da Silva foi homenageado na fase final da sua vida; voltou a sê-lo em 1953 e 2003, cumpridos 100 e 150 anos, respetivamente, sobre a data do seu nascimento. A sua visão do trabalho metódico e dedicado, da Ciência e do Conhecimento, da Universidade e da Cidadania, foi reconhecida nesses momentos e ressoa até hoje, pese embora a novidade dos desafios com que somos confrontados. A legitimidade de trazer à memória, uma vez mais, a sua vida e obra, foi resumida com simplicidade por Rómulo de Carvalho, em 1953: “O nome de Ferreira da Silva merece, inegavelmente, que o apontem aos que o desconhecem e que o recordem aos que já o esqueceram.” Marisa Monteiro Curadora das coleções de instrumentos científicos Museu de História Natural e da Ciência Uma vida de química
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